Percepção de Nomes e Preconceitos Sociais: Um Estudo sobre Estereótipos e Exclusão

CLOO - Behavioral Insights Unit
4 min readAug 14, 2023

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Explorando associações entre nomes e classes sociais no contexto português e suas implicações para inclusão e justiça social — Você já parou para pensar nas primeiras impressões que um nome gera? Muitas vezes, essas impressões tem resultados decisivos negativas e de longo prazo, especialmente para minorias vulneráveis, cujos nomes são percebidos como estranhos ou pouco confiáveis

Em 2021, requerentes para asilo em países europeus, compostos especialmente por nativos da Síria, Afeganistão e Venezuela, apresentaram 632.300 pedidos na União Europeia, e destes, cerca de 537.300 realizaram o pedido pela primeira vez (o que representou um aumento de 34% em relação ao ano de 2020), considerado um aumento significativo. É importante destacar também que no contexto português e europeu de forma geral, o aumento do número de refugiados e imigrantes nos últimos anos pode ter contribuído para uma mudança na percepção da população portuguesa em diversos contextos. Dessa forma, nomes próprios tipicamente atribuídos a estrangeiros, antes vistos como raros e exóticos, hoje muitas vezes são vistos com preconceito e desconfiança.

O Estudo dos Nomes, iniciativa realizada pela CLOO — Behavioral Insights Unit, buscou entender quais associações são feitas entre nome e classe social. Após uma rodada preliminar de consultas informais para reunir nomes associados a determinados status sociais, foram selecionados aqueles mencionados com maior frequência. Nomes como João Maria e Mafalda são interpretados como pertencentes a pessoas de altas classes sociais, enquanto Fábio e Tatiana foram percebidos como pertencentes a classes sociais mais baixas. É importante destacar que esse estudo teve inspiração em outros, como Whiteness of a name: is “white” the baseline?, publicado no Journal of Managerial Psychology e ‘Are Emily and Greg More Employable than Lakisha and Jamal? A Field Experiment on Labor Market Discrimination’’, publicado em The American Economic Review.

Esses estudos, enquanto importantes precedentes, se focaram no contexto estadunidense para melhor entender relações étnicas e econômicas evocadas a partir de nomes. No estudo em questão, buscou-se entender que associações são feitas intuitivamente perante um conjunto de nomes próprios e apelidos no contexto português. Foram analisados nomes associados à classe média, nomes associados às classes sociais e econômicas mais altas e classes mais baixas.

O estudo utilizou da Análise Inferencial Preliminar, escolhida devido à sua capacidade de estimar os sentimentos da população portuguesa abordada em relação aos nomes analisados neste estudo. As associações que mais chamam a atenção são aquelas que de alguma forma alimentam estigmas, exclusão e preconceitos raciais e de classe nesse contexto.

As conclusões deste estudo têm alimentado a condução de outras experiências sobre enviesamentos em processos seletivos, que permitirão o desenvolvimento de intervenções e políticas para tornar esses processos mais inclusivos e menos enviesados, buscando por uma maior efetividade de políticas de inclusão. Algumas das hipóteses aqui confirmadas são:

  1. Os nomes João Maria, Salvador, Vicente, Constança, Mafalda e Benedita são comumente percebidos no contexto português como nomes associados a um status social mais alto.

1a. Pessoas com nomes associados a um status social mais alto tendem a ser percebidas como pessoas confiáveis, com status econômico alto e maior nível de escolaridade.

2. Ainda assim, pessoas que são consideradas de renda média são consideradas os mais confiáveis. Nomes mais conhecidos/comuns tendem a ter um grau de confiança maior do que aqueles associados às pessoas ricas.

Para entender melhor as considerações e aplicações do projeto, é preciso entender como nossos julgamentos e intuições desempenham papéis importantes no nosso dia a dia. Todos nós fazemos, em diferentes momentos, julgamentos usando ora a nossa intuição, ora a nossa capacidade de deliberação.

‘‘A deliberação é melhor para problemas mais analíticos e mais simples e a intuição é melhor para problemas menos decomponíveis numa forma simples, mais complexos, quando a criatividade é necessária e quando a pessoa já é perita’’ (Dijksterhuis, Bos, Nordgren, & van Baaren, 2006; Hammond 1996).

Nossa intuição está relacionada, na maioria das vezes, ao Sistema 1 de pensamento. Esse é o sistema que nos permite tomar decisões de forma rápida e prática no nosso cotidiano, sem que precisemos parar e refletir sobre cada curso de ação a ser seguido. O Estudo dos Nomes apoiou-se, em muito, nessas associações feitas de forma livre e automática perante os nomes e apelidos selecionados.

O Sistema 2 de pensamento está ligado à nossa capacidade de deliberação. Esse é um sistema mais lento e analítico, que normalmente entra em ação durante decisões mais custosas, quando há tempo para refletirmos antes de tomarmos uma decisão. A separação desses sistemas não é uma separação física neurológica, mas um modelo para melhor entendermos as nuances entre esses dois sistemas de tomada de decisão distintos.

A utilização do Sistema 2 não elimina os vieses e os julgamentos muitas vezes estabelecidos no modo de pensar do Sistema 1. Ter mais tempo para refletir e deliberar antes de tomar uma decisão não significa, necessariamente, que essa decisão parta de um pressuposto neutro e livre de vieses e eventualmente até mesmo preconceitos.

Os resultados do estudo demonstram essa persistência dos vieses, já que os nomes relativos à comunidades minoritárias receberam menos contratações, mesmo quando esses eram mais qualificados do que pessoas com nomes tipicamente vistos como pertencentes a classes sociais mais elevadas ou a pessoas brancas.

Esse projeto foi só o início de uma série de processos e experimentações que buscam melhor entender como funcionam os enviesamentos em processos seletivos, o que por sua vez pode alimentar o desenvolvimento de processos mais inclusivos e menos guiados por pré-concepções e julgamentos automáticos. Uma iniciativa simples nesse sentido é a anonimização de algumas informações durante o processo seletivo como, por exemplo, o nome e local de residência.

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CLOO - Behavioral Insights Unit

Especialistas em inteligência científica com foco na aplicação prática das ciências comportamentais às empresas e às políticas públicas.